CURATIVO

Abriu a gaveta da bagunça no quarto e começou a procurar um Band-Aid para o dedo. Tinha se cortado picando cebola e, embora tivesse sido bem superficial, ardia como nunca. Pilhas, canetas, post-it, chaveiro, prendedor de cabelo... Já estava desistindo de encontrar qualquer coisa no meio da tralha, quando viu o formato do saquinho de curativos lá no fundo. Esticou um pouco o braço para alcançar, mas hesitou por um segundo, quando percebeu que embaixo dele havia um envelope marcado com um coração. "Será que... mas eu joguei todas fora." pensou, enquanto sentava na cama e abria o envelope devagar. "Ah, não...". O envelope estava cheio de fotografias que, de alguma forma, haviam sobrevivido à mudança de casa. Respirou fundo, como quem toma fôlego antes de pular no mar, e puxou as fotos para ver. A primeira era dele, que ela mesma tirou em uma das viagens que fizeram juntos. Ele usando os óculos escuros e a camisa de flanela xadrez que ela tanto gostava. Foto dos dois rindo. Foto dos dois andando praia. Foto de um abraço. Foto de um beijo. Já estavam separados há meses, mas de repente foi como se ela pudesse sentir a presença dele ali. Se jogou para trás, deitando na cama. Lembrou do cheiro dele, do toque, de como ela gostava de caber naquele abraço. "Merda..." disse baixinho. Levantou e foi em direção à lixeira, para se livrar das últimas memórias impressas. No entanto, quando fechou a tampa, se deu conta de que a história sobre nosso cérebro conseguir prestar atenção apenas em um machucado por vez era a mais pura verdade. Tinha esquecido completamente do corte no dedo até aquele momento. E agora tudo o que mais queria era que existisse um Band-Aid que funcionasse para o coração.

 

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